quarta-feira, 21 de abril de 2010

Uma vez mais...

"Não quero mais ouvir o teu coração murmurar o meu nome, no fim de cada batalha perdida. Não quero mais ser enfermeira no cenário de guerra em que brincas aos vilões, na certeza perpétua de que estarei sempre para te cicatrizar as feridas gotejantes de miséria humana. Não moldes o teu palato para me chamar, corróis-me quando o fazes e já estou despida demais. Não sou actriz, não uso máscaras. A minha maquilhagem nem é tão eloquente quanto desejarias portanto abre as portas desse teatro emparedado em que insistes em camuflar-te e faz uma nova audição. Cola cartazes por esta Lisboa de mil amores; garanto-te que terás praça cheia. A cada esquina esbarras com o exótico, o diferente, e com certeza ele pavonear-se-á no palco do teu corpo com perfumes almiscarados e adereços coloridos. Não sou dançarina nem nunca aspirei a tal, pela imunidade que tenho às regras e aos passos aprendidos.Toca a tua música para outro alguém cantar, deixa que outra musa te soerga pois já gastámos todas as transcendências. Nas minhas (an)danças não há guião e há muito que perdi a memória de elefante de que um dia me gabei. Vivo de improviso, de mala feita, recheada de sonhos e desilusões apagadas. Só as estátuas da praça apreciam o meu cantar e nunca me julgaram as desafinações distraídas, vítimas de um ouvido atento aos sons da vida mais do que a qualquer pauta em que me possas educar. Quero ser apetite noutras vidas por me descobrir insaciada. Nas noites longas não me sentirei mais menina e nos dias escuros não serei mais pintora de paleta melancólica. Os pincéis endureceram pela falta de uso e o tempo escassei para me sentar e viver-te. Desculpa-me, vou ser génio da lâmpada e conceder desejos noutra freguesia. "


Do autor de http://papel-de-seda.blogspot.com/